Pectinas em alimentos e bebidas: explorando diferentes tipos em aplicações multifuncionais

Cada vez mais valorizadas por suas propriedades naturais, as pectinas se destacam por aliar funcionalidade tecnológica, apelo clean label e contribuição sensorial em textura, corpo e estabilidade.
Por Márcia Fani
Poucos ingredientes conseguem reunir funcionalidade tecnológica e impacto sensorial quanto as pectinas. Derivadas de fontes vegetais, como frutas cítricas e maçãs, são valorizadas por sua versatilidade em diferentes matrizes alimentares, atuando como agentes gelificantes, espessantes, estabilizantes e modificadores de textura. Sua aplicação vai além das tradicionais geleias e compotas, estendendo-se a produtos como balas de goma, recheios de confeitaria, molhos, sobremesas lácteas, sucos com polpa, alternativas plant-based e fórmulas nutricionais.
No aspecto funcional, permitem criar estruturas específicas, modulando viscosidade, retenção de água, estabilidade térmica e resistência ao congelamento e descongelamento. Já no plano sensorial, contribuem para aprimorar brilho, maciez, cremosidade e elasticidade, além de reduzirem sinérese e mascararem notas amargas ou metálicas.
Seu desempenho é diretamente influenciado pelo tipo de pectina utilizado, definido por seu grau de metoxilação, ou grau de esterificação (DE – Degree of Esterification), origem botânica utilizada na extração e possíveis modificações químicas ou enzimáticas, variáveis que influenciam diretamente o seu comportamento gelificante, solubilidade, resistência a pH, necessidade de açúcar ou presença de íons cálcio.
As pectinas de alto metoxilado (HM) apresentam grau de esterificação superior a 50% e requerem condições ácidas (pH entre 2,8 e 3,5) e concentrações elevadas de açúcar (tipicamente acima de 55%) para formarem géis termorreversíveis. São ideais para aplicações clássicas como geleias, marmeladas, doces cristalizados, coberturas ou revestimentos de frutas e balas de goma com textura firme e brilho.
As pectinas de baixo metoxilado (LM) possuem grau de esterificação inferior a 50% e formam géis na presença de íons divalentes, como o cálcio, independentemente da quantidade de açúcar. Essa característica é valiosa em formulações com teor reduzido de açúcar ou adoçadas artificialmente, além de sobremesas lácteas, recheios termoestáveis, molhos e produtos infantis.
Dentre as LM, destaca-se a pectina amidada (LMA), que apresenta parte dos grupos metila substituídos por grupos amida, o que confere maior tolerância a variações de pH e teor de cálcio, além de melhorar a estabilidade térmica e a reversibilidade da gelificação, características valorizadas em produtos sujeitos a processamento térmico severo ou congelamento.
Quanto à origem botânica, a maior parte das pectinas utilizadas comercialmente provém da casca de frutas cítricas (laranja, limão e toranja) e da polpa ou bagaço de maçã. As pectinas cítricas são amplamente preferidas na indústria por apresentarem perfil funcional robusto, desempenho consistente e maior disponibilidade de matéria-prima. Já as pectinas de maçã, embora com custo de produção mais elevado, possuem sabor mais neutro e coloração clara, sendo úteis em formulações com sensorial mais delicado.
Outras fontes emergentes, como maracujá, beterraba, bagaço de uva e resíduo de cacau, vêm sendo pesquisadas, especialmente em projetos que envolvem economia circular, valorização de resíduos e produção local.
Demandas do mercado global
Avaliado em aproximadamente US$ 1,26 bilhão em 2024, com projeções indicando que atingirá cerca de US$ 2,32 bilhões até 2033, crescendo a uma taxa anual composta (CAGR) de 7% durante o período de 2025 a 2033, segundo dados da Mordor Intelligence, o mercado global de pectinas tem demonstrado crescimento robusto, impulsionado pela crescente demanda por ingredientes naturais e saudáveis na indústria alimentícia.
De acordo com a Markets and Markets, as pectinas de alto metoxilado (HM) continuam sendo as mais utilizadas, principalmente em produtos como geleias, marmeladas e balas de goma, onde a formação de gel firme é necessária, representando cerca de 60% a 65% do uso global, especialmente em aplicações que requerem a presença de altas concentrações de açúcar.
As pectinas de baixo metoxilado (LM), por outro lado, ganham terreno em produtos com baixo teor de açúcar, como geleias diet e produtos reduzidos em calorias, respondendo por 25% a 30% do mercado.
Já as pectinas amidadas (LMA), que possuem maior resistência a variações de pH e maior estabilidade térmica, têm papel crescente em formulações de produtos que sofrem processamento térmico severo ou congelamento, embora sua participação ainda seja mais restrita, representando cerca de 5% a 10%.
O principal segmento de consumo de pectinas são alimentos e bebidas (75% a 80%), seguido por produtos farmacêuticos (5% a 10%), cosméticos (5%) e outros (5% a 10%).
A forma mais comum utilizada no mercado global é em pó, representando cerca de 70% a 80% da demanda, amplamente usadas em produtos alimentícios e bebidas. As pectinas líquidas representam cerca de 20% a 25% do mercado, sendo frequentemente utilizadas em processos em que a dissolução rápida e a homogeneidade são essenciais, como em bebidas e produtos de gelificação em grande escala. Já as pectinas em gel, menos comum, tem uma participação pequena, abaixo de 5%, sendo usadas principalmente em aplicações específicas, como alimentos de alto valor agregado.
Na América Latina e no Brasil, o mercado de pectinas também segue em expansão, impulsionado principalmente por categorias como sucos com polpa, sobremesas refrigeradas, produtos de confeitaria e laticínios.
Dados da Euromonitor International relatam que as pectinas de maçã têm ganhado espaço na região, devido ao seu sabor mais neutro e a sua coloração clara, refletindo uma tendência de inovação dentro da indústria alimentícia, com crescente demanda por ingredientes que atendam às exigências de rótulos mais limpos e formulações com ingredientes naturais.
No Brasil, embora dados específicos sobre o mercado de pectinas sejam limitados, é possível observar aumento na demanda por ingredientes naturais e funcionais, alinhado às tendências globais, posicionando as pectinas como uma escolha preferencial.
Propriedades funcionais e interações tecnológicas
As pectinas apresentam uma gama de funcionalidades tecnológicas que vão além da gelificação, abrangendo desde a estabilização de emulsões e suspensões até a modificação da textura e do comportamento reológico.
São amplamente utilizadas para estabilizar suspensões, evitando a sedimentação de partículas; formam uma rede tridimensional que envolve as partículas, aumentando a viscosidade e a carga elétrica superficial, o que evita a sedimentação por efeito gravitacional. Essa atuação é especialmente útil em bebidas com polpa de frutas ou fórmulas fortificadas com minerais. Em sucos de frutas e néctares, por exemplo, ajudam a manter as partículas de polpa suspensas na solução, impedindo a separação durante o armazenamento.
Outro aspecto funcional importante é o controle da sinérese, que pode ocorrer durante o armazenamento ou processamento. As pectinas controlam esse fenômeno, proporcionando uma consistência mais estável, evitando a formação de água na superfície, mantendo a viscosidade estável e a integridade dos produtos. As pectinas de baixo metoxilado (LM) são altamente eficazes na redução da sinérese em produtos lácteos e sobremesas.
A texturização é uma das propriedades de maior destaque das pectinas, fornecendo corpo e consistência a uma vasta gama de produtos alimentícios. Sua capacidade de formar uma rede de gel fino cria a sensação de cremosidade ou espessamento, sem o uso de ingredientes artificiais, conferindo viscosidade ideal, de modo que o produto tenha a fluidez desejada, sem que se torne excessivamente espesso ou difícil de espalhar.
As pectinas também desempenham papel importante na formulação de alimentos com redução de açúcar. Em produtos como geleias, molhos, sobremesas e bebidas, onde o açúcar tradicionalmente exerce funções estruturais e sensoriais, contribuem para manter a textura, o brilho e a sensação na boca mesmo com menor teor de sacarose. Sua capacidade de formar géis em presença de cálcio, no caso das pectinas de baixo metoxilado, permite alcançar a consistência desejada sem a necessidade de altas concentrações de açúcar. Assim, viabilizam formulações com menor valor calórico, mantendo a estabilidade e a aceitação sensorial do produto final.
Um dos desafios nas formulações de alimentos e bebidas é o mascaramento de off-notes, provenientes de ingredientes com sabor ou notas sensoriais indesejadas. Ao interagirem com compostos voláteis, as pectinas ajudam a suavizar esses sabores, melhorando a palatabilidade ao reduzirem a intensidade de sabores amargos e metálicos, promovendo uma percepção sensorial mais equilibrada.
Uma das funções mais tradicionais das pectinas é o aumento da viscosidade, fundamental para a estabilidade e sensação sensorial em formulações líquidas e semissólidas, onde não apenas contribuem para a textura, mas também para garantir a estabilidade dos produtos ao longo do tempo, assegurando que mantenham sua forma e consistência durante o processo de armazenamento e distribuição.
As pectinas interagem de maneira sinérgica com vários outros ingredientes, como amidos modificados, gomas guar, carragena, gelana e proteínas, aprimorando ainda mais as características funcionais dos produtos. Ao serem combinadas com amidos modificados, por exemplo, melhoram a estabilidade térmica de géis ou emulsões, fornecendo maior resistência a variações de temperatura e a ciclos de congelamento e descongelamento. Da mesma forma, ao serem misturadas com goma guar ou gelana, podem ajustar a elasticidade e o brilho em produtos gelificados.
Em algumas aplicações, as pectinas podem atuar como estabilizante de emulsões, como em maioneses e molhos com alta concentração de óleos, onde sua capacidade de interagir com moléculas de água e óleo permite formar uma emulsão estável. Essa interação também é importante em sorvetes e sobremesas congeladas, onde a combinação de pectinas com estabilizantes pode ajudar a melhorar a cremosidade e reduzir a formação de cristais de gelo, melhorando a textura do produto final.
Reduzindo açúcar sem comprometer sabor e textura
Com a entrada da nova legislação para rotulagem nutricional em alimentos embalados, que exige alertas claros sobre alto teor de açúcar adicionado, gordura saturada e sódio, cresce a demanda por rótulos limpos e transparentes.

Lígia Fonseca, Especialista de Produto II – Food & Nutrition na IMCD Brasil









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